Se você perguntasse "o quê é perdão?" a qualquer pessoa, principalmente aos mais velhos, muito provável que a resposta estaria ligada àquele perdão instruído pelo profeta Jesus de Nazaré. Essa primeira concepção do termo "perdão" que vem à nossa mente carrega um sentido religioso (para nós, ocidentais, o sentido cristianista). Sob essa ótica, o perdão pode ser definido como o ato de perdoar o mal praticado por outrem, sem conservar a idéia perturbadora.
O evangelista Mateus, numa de suas passagens, cita: "de fato, se vocês perdoarem aos homens os males que eles fizeram, o Pai de vocês que está no céu também perdoará a vocês. Mas, se vocês não perdoarem aos homens, o Pai de vocês também não perdoará os males que vocês tiverem feito" (Mt 6:14-15). É notável a semelhança entre tal passagem e o modelo ideal de norma autônoma proposto por Kelsen: se não perdoar o mal de outrem (pressuposto), Deus não perdoará o teu mal (consequência). Ou seja, aquele que for fiel aos mandamentos divinos será um homem justo, e não sofrerá a sanção divina. Essa passagem bíblica é um exemplo claro de como a religião influencia diretamente os ordenamentos jurídicos ocidentais. No nosso Código Penal temos o clássico exemplo do Art. 121, "Matar alguém: Pena - reclusão, de 6 a 20 anos"; uma conduta típica, antijurídica e culpável.
Os nossos legisladores penais, assim como os evangelistas, tratam do perdão. O ofendido, nos casos de ação penal de iniciativa privada, tem a faculdade de perdoar o infrator, impedindo o prosseguimento da ação (desde que não passe em julgado a sentença condenatória). O legislador preza a conduta do perdão, em detrimento da função do Direito Penal de ser instrumento inibidor de condutas lesivas tipificadas, atendendo ao princípio da intervenção mínima. A intervenção penal somente se justifica quando é absolutamente necessária para a proteção dos cidadãos; e, por se tratar de uma faculdade do particular, oferecido o perdão deste, não há o que se falar em ação do Estado punidor. Há também a figura do perdão judicial, aplicado quando o resultado da conduta típica praticada pelo réu lhe cause tal sofrimento que, aos olhos do legislador, seria dispensável a aplicação de uma pena, já que o próprio sofrimento do réu torna a sanção penal desnecessária. Por isso que no nosso ordenamento penal o perdão judicial é uma das formas de extinção da punibilidade. Ademais, a sentença que o conceder, não será considerada para os efeitos de reincidência (Art. 120 do Código Penal). É o caso, corriqueiro nos noticiários, do pai que esquece seu filho dentro do carro, vindo esse a morrer por desidratação (devido o calor acumulado dentro do veículo trancado). É notória a repulsa pelo resultado por parte do pai, que talvez carregue essa culpa pelo resto de sua vida, nem mesmo se perdoando. Por isso, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, como disposto pelo Art. 121, §5° do Código Penal.
O Código Civil também trata do perdão. A "remissão" é o perdão da dívida dado pelo credor. O ponto curioso é que cabe ao devedor a faculdade de aceitar ou não essa forma de perdão (há a questão da honra do devedor, levada em consideração pelo legislador). Mas, há que se observar que tal remissão não poderá prejudicar terceiros. A parte que concede a remissão tem que ser solvente; quem está em dificuldades financeiras não pode perdoar seus devedores, afinal, estará prejudicando seus próprios credores. Caso o faça, poderá incidir em fraude contra seus credores, como prevê o Art. 158 do Código Civil (trata-se de uma presunção absoluta de fraude a remissão de dívida feita pelo insolvente).
O Cristianismo, como religião, ensina aos seus fiéis valores e princípios a serem seguidos e obedecidos. Tais valores e princípios possuem a finalidade de alcançar o justo. Esse é o ponto em que se torna mais nítida a influência da religião sobre o Direito, já que a religião visa conduzir seus fiéis a determinadas condutas sociais e proibições, a fim de que o objetivo final, que é a justiça, seja atingido. Assim como a religião, o Direito traz mecanismos de controle social, que impõem condutas e valores, com a finalidade do bem comum. O perdão é um exemplo de valor religioso, e, como exposto anteriormente, fora aproveitado pelo Direito como instrumento jurídico para a finalidade da harmonia social.
E MUITO BOM OBRIGADO
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