sexta-feira, 5 de março de 2010

Nem todos merecem o perdão do Judiciário

Muito se fala sobre justiça, seja no intuito de conceituá-la de forma clara e precisa, seja para reclamar a sua ausência em nossa sociedade. Juntamente com a justiça vem o famoso perdão. Ouve-se por aí: “O Judiciário perdoa todo mundo” (por todo mundo, é claro, entenda-se políticos e pessoas super influentes/da classe alta - se é que não dá no mesmo).

Mas, será que perdoa mesmo?

Perdoar, pode até ser que não perdoe, mas, com certeza, não julga: pesquisa feita pelo Congresso em Foco revela que o STF, entre junho e outubro de 2009, arquivou 14 denúncias e ações contra deputados e senadores federais (quase uma por semana!).

Quem se lembra, por ex., de que o STF rejeitou a abertura do processo penal contra Palocci, pela quebra do sigilo bancário de seu caseiro? Os ministros decidiram pelo arquivamento por ausência de provas significativas, ignorando o (ótimo) voto do ministro Ayres Brito: “Bastam os indícios. Se precisarmos de prova robusta neste momento, já teremos a certeza da condenação dos denunciados. Os indícios me convencem”. (Os indícios me convencem também, Brito).

Mas, peraí, o próprio Gilmar Mendes já afirmou que o STF "não cuida só do interesse dos ricos" de acordo com ele, dos 350 habeas corpus concedidos em 2008, 18 foram pelo princípio da insignificância. Realmente, 18 em 350 é um número muito (in)significante.

Não sei quais foram os 18 privilegiados, mas sei quem não foi. O requerimento de habeas corpus feito por uma mulher condenada a mais de um ano de prisão pelo furto de caixas de chiclete(que totalizavam um valor de R$98,80 e foram reavidas) foi negado por decisão do Ministro Marco Aurélio. A autora, que requereu a aplicação do princípio da insignificância, foi condenada em primeira instância a três anos de prisão, teve a pena reduzida para um ano e três meses pelo STJ e aguarda julgamento definitivo pelo STF.

O referido princípio se pauta na idéia de que não basta que o infrator cometa um crime, é necessário que sua conduta possua certo grau de lesividade, capaz de justificar a punição pelo Direito Penal. Em termos básicos, pode ser comparado a um “perdão” concedido pelo Judiciário no âmbito penal (não vamos confundir com o instituto do "perdão judicial"). Há alguma dúvida sobre qual teria sido a solução para o caso da mulher caso essa fosse...política?

Nenhuma dessas soluções é plenamente satisfatória porque enquanto uma é benevolente demais a outra se apresenta muito rígida para um fato insignificante (furto de pequeno valor).

Infelizmente, a rigidez que guiou a decisão do segundo caso não esteve presente no primeiro. Na verdade, parece nunca estar presente quando os acusados são determinados rostos/nomes do cenário político brasileiro: surpreendentemente ou não, o Supremo Tribunal Federal brasileiro nunca condenou um membro do Congresso.

É, como disse Bertold Brecht, "alguns juízes são absolutamente incorruptíveis. Ninguém consegue induzi-los a fazer justiça." Juízes e ministros, eu diria.

Espera-se que isso mude, aliás, espera-se que as mudanças já tenham começado (o pedido de habeas corpus feito por Arruda foi recentemente negado) e que, no futuro, ouça-se por aí que o Judiciário faz justiça e perdoa, não quem lhe convém, mas sim quem merece ser perdoado, ainda que não tenha voz ou influência para pedir esse tal “perdão”.

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