sexta-feira, 12 de março de 2010

Delação Premiada

De acordo com a Lei n.º 8.072/90, em seu artigo 8º, parágrafo único, “o participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços”. A norma supracitada instituiu a delação premiada no ordenamento jurídico brasileiro.



O penalista Damásio de Jesus assim define tal instituto:


Delação é a incriminação de terceiro, realizada por um suspeito, investigado, indiciado ou réu, no bojo de seu interrogatório (ou em outro ato). "Delação premiada" configura aquela incentivada pelo legislador, que premia o delator, concedendo-lhe benefícios (redução de pena, perdão judicial, aplicação de regime penitenciário brando etc.).



O que se espera de uma norma jurídica é que ela esteja pautada em valores tidos como éticos pela sociedade. Ao premiar o criminoso que acusou o seu bando ou quadrilha, estamos justificando um ato não tão louvável, que é a traição.

Possivelmente, justificar a traição como um meio para se atingir um bem maior, que é a segurança, não é a forma mais eficaz de se resolver o problema. Se valer de valores avessos ao Estado Democrático de Direito, acaba por esvaziar tal conquista. O certo seria difundir os princípios constitucionais, buscando solucionar conflitos por meio de normas baseadas na ética. Se o Estado tem como objetivo zelar pelo bem-estar e atenuar problemas sociais, deve, no mínimo, dar bons exemplos.

Ao legitimar a traição do criminoso, tratando-o como mais uma aliado na luta pela chamada paz social, o Estado se iguala ao próprio delinqüente e, de certa forma, à criminalidade. A tortura, a ameaça, perseguição política, dentre outros, já foram bastante utilizados em tempos nada democráticos em nosso país. A delação premiada não chega a ser tão indesejável, mas não deixa de nos remeter a tempos em que a máxima “os fins justificam os meios” era empregada de forma bastante corriqueira.

A lógica utilizada pela delação premiada é a mesma que está contaminando o Direito Penal. O Estado, por esse método, busca diminuir a criminalidade de forma rápida, exemplar, agressiva. A idéia defendida não é a da prevenção, e sim a da punição. Não se quer recuperar o delinqüente ou buscar qual a motivação o criminoso teve ao cometer o delito. O Estado nada mais faz do que satisfazer os anseios punitivos da sociedade, ávida por condenação.

Defendendo uma lógica contrária a essa, assim escreveu o escritor Eduardo Galeano:


"O poder corta e torna a cortar a erva daninha, mas não pode atacar a raiz sem atentar contra a própria vida. Condena-se o criminoso, não a máquina que o fabrica, como se condena o viciado e não o modo de vida que cria a necessidade de consolo químico ou sua ilusão de fuga. E Assim se exime de responsabilidade uma ordem social que lança cada vez mais gente às ruas e às prisões, e que gera cada vez mais desesperança e desespero. A lei é como uma teia de aranha, feita para aprisionar moscas e outros insetos pequeninos e não os bichos grandes."

quinta-feira, 11 de março de 2010

Cumprir a pena basta?


"Atualmente, as penas, as condenações (de modo geral, de todos os campos do Direito) trazem justiça? E junto com a justiça trazem o perdão? Enfim, justiça e perdão são conceitos que "andam sempre juntos"? E ainda, são conceitos que devem "andar juntos"? O ordenamento jurídico atual permite que isso aconteça?" (Daniel Chaves)

"Esta situação espelha não só o repúdio dos brasileiros contra os delitos mais cruéis, como também a dificuldade de perdoar tais comportamentos, inclusive após o cumprimento da sentença. Em episódios deste tipo, surge da criminalidade a mais severa das punições, que penaliza o criminoso com duas penas. Primeiramente, a da justiça: criada para todos, imparcial, delimitada pelo tempo e, por sua natureza, perdoável juridicamente ao fim de seu cumprimento. Posteriormente, a social: moralmente questionadora, imperdoável na maioria dos casos e que se arrasta, indefinidamente, pelo tempo." (Ana Clara Furtado)


Escrever sobre justiça e perdão tem se revelado um assunto extremamente difícil, tanto pela diversidade de opções quanto pela conotação das duas palavras. O conceito de Justo e Justiça é discutido desde os mais primórdios tempos, ao ponto de já se ter afirmado que é impossível responder o que é justiça. Perdoar, dentre vários de seus significados, pode ser entendido como dar por completo, desculpar. Mas mais difícil ainda é escrever sobre o assunto após vários outros textos, principalmente quando escritos por colegas.

Ao nos indagar se as penas e condenações trazem justiça e o perdão, o Daniel nos convida a refletir sobre um assunto muito controverso: aquele que cumpre a pena, está perdoado? O perdão jurídico deve ser entendido como o perdão social?

Para tentar lançar uma discussão sobre o tema é que eu escrevo:


OS DOIS CRIMES DE FRANCISCO

2 de agosto de 1966, Francisco conhece Margareth e após conversarem resolvem ir para o apartamento dele esticar a noite. Tomado por um impulso inexplicável, Francisco estrangula Margareth e após matá-la esquarteja a mulher. No dia 5 de agosto, ele se entrega à polícia. É sentenciado então a 18 anos de reclusão por homicídio e 2 anos e seis meses de prisão por destruição de cadáver. Apresenta um comportamento exemplar e sua pena é comutada então para 14 anos, quatro meses e 24 dias. Cumpre 8 e é posto em liberdade.

Em 15 de outubro de 1976, Francisco conhece Ângela e após uma conversa resolvem ir para o apartamento dele esticar a noite. Tomado por um impulso inexplicável, estrangula Ângela e após matá-la esquarteja a mulher. No dia 26 de outubro é preso pela polícia tentando embarcar para uma cidade do interior.

Francisco então é novamente condenado: 22 anos e seis meses de reclusão. Reparem que a pena comutada a ele se deu antes da reforma penal de 1984 quando ainda era possível a aplicação da pena privativa de liberdade e a medida de segurança. Com o advento da referida reforma isso se tornou incabível com a escolha do sistema vicariante, ou se aplica a pena privativa ou se aplica a medida de segurança.

Pois bem, devido à barbaridade e crueldade do seu crime, Francisco passou a ser estudado por psicólogos e psiquiatras forenses e em 1994 foi diagnosticado como dotado de “personalidade psicopática perversa e amoral, desajustada do convívio social e com elevado potencial criminógeno”, e, assim, considerado incapaz de viver em sociedade. Ressalte-se que no caso é alegado não haver instituição no País capaz de receber e cuidar de Francisco.

Em 1998, Francisco deveria ter sido solto, mas uma ação de interdição de direitos, embasada em um decreto de 1934 fez com que continuasse preso, e assim continua até hoje, 12 anos após o fim da sua pena! Ora pois, cria-se dessa forma a esdrúxula figura kafkaniana da “prisão civil por interdição”, não só isso uma prisão que beira a perpetuidade.

Vejamos então, Francisco foi preso e cumpriu sua pena, logo poderíamos pensar que ele estaria juridicamente perdoado, mas sua prisão esteve longe de alcançar a pretendida resocialização. A pena não “curou” Francisco. Foi feita justiça nesse caso? É justo que Francisco continue preso até hoje? A sociedade poderia perdoar Francisco? Ou seria difícil falar em perdão para “Chico Picadinho”?

A justiça e o perdão

Capacidade de perdoar

Um ser humano só consegue desenvolver

A capacidade de perdoar o seu semelhante

Se ele próprio reconhecer que

Todos sem exceção são passíveis

De cometer erros ao longo da vida

(Jeugam)

O que é justiça? O que é fazer justiça? Atualmente, em conceito bem genêrico , justiça é algo que é merecido, ou algo que deve ser alcançado para que o certo prevaleça sobre o errado, ou que o indevido se torne novamente devido; fazer justiça poderia ser retribuir um mal com outro mal. Por exemplo, uma pessoa que rouba: para que seja feita justiça ela deve ser presa e condenada de acordo com as penas previstas no nosso ordenamento jurídico em direta proporção à sua conduta. Ou ainda, poderia ser através de ação reprovada pelo Estado, popularmente conhecida como “fazer justiça com as próprias mãos” e variados outros conceitos mais.

E o que seria perdoar? Ao nosso ver é superar, é “virar a página”, seguir em frente sem guardar mágoas passadas. Para alguns outros é simplesmente algo que nos traz paz.

Tendo em vista essa pequena e singela reflexão, convido autores e visitantes do blog a debaterem e compartilharem suas concepções:

O que é para você o conceito de justiça e o conceito de perdão?

Atualmente, as penas, as condenações (de modo geral, de todos os campos do Direito) trazem justiça? E junto com a justiça trazem o perdão? Enfim, justiça e perdão são conceitos que "andam sempre juntos"? E ainda, são conceitos que devem "andar juntos"? O ordenamento jurídico atual permite que isso aconteça?

Participe! Poste seu cometário acerca do tema e enriqueça mais ainda o conteúdo do nosso blog.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Perdão Judicial nos Delitos de Trânsito

O Código Penal Brasileiro prevê no art. 107, IX, o perdão judicial como causa extintiva de punibilidade, que é permitido, dentre outros, nos crimes de homicídio culposo e lesão corporal culposa (arts. 121,§ 5º e 129, § 8º).


A grande questão é : o perdão judicial é admissível nos crimes de homicídio culposo e lesão corporal culposa descritos nos arts. 302 e 303 do Código Brasileiro de Trânsito?


Há opiniões negativas, argumentando-se que o art. 300 do projeto de lei do CBT, que admitia o perdão judicial, foi vetado pelo Presidente da República, dessa forma proibindo a sua aplicação. Além disso, o art. 291, "caput" do CBT, determina a incidência subsidiária das "normas gerais" do Código Penal e o perdão judicial está elencado na parte especial, motivo pelo qual, tal benefício não deve ser aplicado. E, ainda, nos termos do art. 107, IX do CP, o perdão judicial só é permitido nos casos previstos em lei, e não está disciplinado no Código de Trânsito. Essa causa extintiva de punibilidade é de aplicação restrita aos casos legais, ou seja, soemente aos crimes expressamente previstos na lei.


Por outro lado, há quem diga que o perdão judicial é admissível nos crimes de homicídio culposo e lesão corporal culposa cometidos no trânsito, sob o argumento de que, não são convincentes as teses de que o CBT, por força de seu art. 291, "caput" , somente são aplicáveis as normas gerais do Código Penal, encontrando - se o perdão judicial na parte especial, e que esse instituto só é admissível nos casos previstos em lei.


Os arts. 302 e 303 do CBT tratam de "crimes remetidos", isto é, a norma penal incriminadora faz menção a outra, que a integra. Tal referência pode ser feita de duas formas:


1ª - mencionando o número do artigo da outra lei incriminadora;


2ª - inserindo o "nomen juris" da infração penal no delito autônomo.


O CBT, ao descrever o homicídio culposo e a lesão corporal culposa, se utilizou da segunda forma, inserindo as denominações legais desses crimes nas definições típicas: "praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302); praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor (art. 303).


Portanto, conclui-se que, por se tratar de crimes remetidos, o homicídio culposo e a lesão corporal culposa praticados no trânsito, deveriam ser incluídos no rol dos crimes amparados pelo perdão judicial, o que torna sua proibição absurda e de flagrante insconstitucionalidade, uma vez que fere o princípio da igualdade, pois, a morte culposa de ente querido causada na direção de veículo automotror não admite o perdão judicial; nas relações comuns, fora do trânsito, permite.
Fica a indagação: A dor de quem mata uma pessoa querida sem intenção em um acidente de trânsito é menor do que a de quem mata culposamente em outras situações?

terça-feira, 9 de março de 2010

Lei de Anistia: A utópica justiça coexistindo ao conveniente perdão


Qual é a face do nosso passado? Fortes lembranças tem contracenado com inexplicáveis esquecimentos quando o tema resgatado diz respeito aos longos e infindáveis anos de ditadura militar no Brasil. As lembranças daquele "Brasil: ame-o ou deixe-o" impunham como dever ser a dualidade entre a permanência no país como instrumento do jogo do poder ou a imediata retirada, acatada como resultado justo da negação do exercício patriótico.
O exílio, sentido como violenta forma de coerção disseminou o medo, mas não foi suficientemente temido ao ponto de intimidar cidadãos que dia-a-dia denunciavam o cerceamento daqueles direitos considerados mais fundamentais à existência humana. O povo negou-se a acatar ordens do obscuro silêncio, fazendo da voz da massa a principal arma de enfraquecimento do regime até então dominante. A abertura lenta e gradual no governo Geisel significou o início de um novo final, que levaria a pátria à momentos de grande euforia, quando em 1979 o então General Figueiredo sanciona a Lei de Anistia.
O governo militar procurou os melhores argumentos para justificar a promulgação da supracitada lei, explicando a palavra anistia como sinônimo de perdão. Assim, nos diz o artigo primeiro que estariam extintos de punibilidade - ou seja, perdoados - todos os responsáveis por atos considerados crimes eleitorais, políticos e os conexos com estes, excluindo-se desse ato de benevolência os torturadores e sequestradores.
Quão justa se mostra essa legislação, não acham? Ironias à parte, mas o fato é que o povo se acabou dando por enganado, optando por assassinar um passado outrora vivo. Partiu-se então à reconstrução de novo futuro. Nas palavras do cantor e compositor Chico Buarque "a ditadura emburreceu o Brasil e provocou amnésia política na população". Obviamente os objetivos eram outros e "constituíam em liberalizar o regime, não para superar a ordem autoritária, mas para institucionalizá-la", segundo aponta o sociólogo e ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
O caminho do esquecimento trouxe a sociedade ao presente para, trinta anos após a concessão de anistia, comemorar com hipocrisia três décadas de superação. Pergunto: Houve justiça? Todos deveriam ter sido devidamente culpados ou todos deveriam ter sido devidamente inocentados??? Acredito que uma lei de anistia ampla, geral e irrestrita deixou muito a desejar com relação aos entes que atacaram violentamente os princípios morais e éticos. Puniram-se os rotulados como terroristas e declaram inocentes os militares sanguinários que se dedicavam à arte da tortura. Essa disparidade, no que tange a questão da punibilidade, demonstra a ausência da justiça e a inércia dos brasileiros por não tê-la exigido no momento oportuno. Preferiram adormecer a história e somente acordá-la num momento em que o Estado já carecia de legitimidade para o exercício do jus puniendi.
Um despertar tardio significou um ponto final ao direito de se fazer justiça. O que resta agora é apenas conformismo, visto que a menor tentativa significará um atentado à égide de um Estado Democrático de Direito. Conquistamos o renascimento da democracia arduamente e um dos preços a se pagar por essa conquista consiste em respeitar as regras previamente estabelecidas. O tempo de reclamar atrocidades acabou na data da promulgação da Constituição de 1988, que em seu artigo 5º, XXXVI, nos ensina que a "lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada".
A impossibilidade de levar à julgamento as atrocidades cometidas ao longo do período militar, ainda se mostra controversa na visão dos mais esperançosos. O governo lulista carregado de boas intenções reservou o Eixo Orientador VI, intitulado como "o direito à memória e à verdade", da Cartilha dos Direitos Humanas editada em dezembro de 2009, almejando iniciar a punição dos culpados. Críticas à parte, mas esqueceram-se que o direito de ação está prescrito há algumas décadas, concluindo-se que os objetivos tão almejados não conseguirão sair do mundo que Platão afirmava pertencer às ideias. Resta agora aprender com a história, pois o tempo de investigá-la e julgá-la infelizmente foi deixado para trás.

domingo, 7 de março de 2010

Pena de Morte:os limites entre a Justiça e o Perdão



“Que devem pensar os homens ao ver os sábios magistrados e os graves sacerdotes da justiça, que com indiferente tranquilidade e aparato vagaroso conduzem o réu á morte?Enquanto o miserável se debate, em sua derradeira angústia, à espera do golpe de misericórdia, continua o juiz, com insensível frieza,e quem sabe , com secreta complacência pela própria autoridade, a degustar o conforto e os prazeres da vida.”(Cesare Beccaria)

A história da humanidade nos dá idéia do imenso oceano de erros, do qual emergem, a grandes intervalos, algumas poucas verdades confusas. Sacrifícios humanos eram comuns em quase todas as nações , mas quem ousará desculpá-los?O fato de que algumas sociedades tenham abolido por pouco tempo a pena de morte, mais favorece do que desabona porque o destino das grandes verdades é o de não durar mais do que um relâmpago, em comparação com a longa noite que envolve os homens. Ainda não chegou a época afortunada em que a verdade como o erro até agora, pertencerá à maioria. Dessa lei universal só se subtraíram até agora as grandes verdades que a Sabedoria infinita quis separar das outras por meio da Revelação.

A palavra de um filósofo seria muito débil contra os tumultos e os gritos dos que são guiados pelos cegos costumes, mas os poucos sábios que estão espalhados pela face da terra acompanharão sua voz, no fundo de seus corações e, se a verdade pudesse alcançar o trono, entre os infinitos entraves que a afastam do monarca, malgrado seu, saiba ele que ela trouxe consigo os votos secretos de todos os homens. Saiba que ele se calará na sua presença a fama sangrenta dos conquistadores e que a justa posteridade lhe reservará o primeiro lugar entre os pacíficos troféus dos grandes imperadores que como Antonino, o Piedoso tinham o notável espírito de moderação e justiça.

A pena de morte não é aplicada aqui no Brasil, fato que não nos tira o dever de discutir sobre tal fato, a pena de morte não é, portanto um direito, ela é a guerra da nação contra o cidadão, que julga útil ou necessário matar.A pena de morte é tratada como sendo um castigo para causar um forte grau de impressão sobre o espírito humano, porém a sensibilidade humana é mais facilmente e mais constantemente afetada por impressões mínimas, porém renovadas, do que por abalo intenso, mas efêmero.A pena de morte também não é útil pelo exemplo de crueldade que oferece ao homem. Se as paixões ou as necessidades da guerra o ensinaram a derramar o sangue humano, as leis moderadoras da conduta do homem não deveriam aumentar jamais o feroz exemplo.

O perdão deve ser analisado com muito cuidado em situações em que a pena de morte figura como sanção, como acontece em alguns estados americanos como a Califórnia.O ato de perdoar não envolve somente a extinção de punibilidade,existem casos em que a sanção é necessária, mas o perdão deve orientar os magistrados e sacerdotes da justiça, uma vez que não vivemos mais no ano 1780 a.C, onde a lei de talião(o latim lex talionis: lex: lei e talis: tal, parelho) aplicava a rigorosa reciprocidade do crime e da pena — apropriadamente chamada retaliação.

Perdoar é aprender a raciocinar e questionar os fatos, analisando de forma minunciosa as leis que devemos respeitar e que põe tão grande distância entre nós e os desafortunados que são condenados pelas cruéis formalidades.

sábado, 6 de março de 2010

Lei da Anistia

O Brasil enfrentou um período conturbado e altamente violento conhecido como Ditadura Militar. Esse período iniciou-se em 1964, com um golpe militar articulado pelas forças armadas, contra o presidente João Goulart e durou até 1985, quando Figueiredo sai do governo, após a eleição de Tancredo Neves para Presidente da República. Os militares que assumiram nesse período o comando do Brasil foram responsáveis por perseguições e morte dos opositores políticos, todavia, após o término do regime, eles não foram responsabilizados por esses crimes políticos e pelas torturas cometidas, uma vez que se beneficiaram do artigo 1º da Lei 6.683/79 (Lei de Anistia).

Entretanto, em 2009, uma ação proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil-OAB, perante o Supremo Tribunal Federal, reacendeu a discussão a respeito desse tema, e colocou valores de perdão e justiça lado a lado. A ação visa acabar com o perdão aos militares que cometeram crime de tortura, por considerar injusto o artigo primeiro da Lei de Anistia perante a sociedade, uma vez que tais crimes são lesivos a vida e a dignidade da pessoa humana, fundamentos constitucionais e considerados como crimes de lesa-humanidade. Essa ação, além de incendiar a população, também tem sido motivo de difíceis embates no cenário político brasileiro.

O Ministro da Defesa Nelson Jobim é contra revogação da Lei de Anistia, e tem sua opinião reiterada pelo Procurador Geral da República, Roberto Gurgel, que diz: “A sociedade civil brasileira, para além de uma singela participação neste processo, articulou-se e marcou na história do país uma luta pela democracia e pela transição pacífica e harmônica, capaz de evitar maiores conflitos”. Para ele, a Anistia no Brasil foi resultado de um longo debate nacional com a participação de diversos setores da sociedade para viabilizar a transição entre o regime autoritário militar e o regime democrático atual.

Em linha contrária, encontra-se a opinião de Tarso Genro: “Tortura é crime imprescritível e inafiançável. Julgar esses casos representa a continuidade do processo de democratização do país”. Essa mesma opinião é compartilhada pelo cantor Chico Buarque, pelo filósofo Leandro Konder e pelo ex-ministro Aloísio Nunes Ferreira.

No entanto, apesar de muitos concordarem com a punibilidade dos militares pelas torturas que realizaram, não podemos passar por cima da Constituição. O preço a se pagar por optar pela democracia é respeitar as regras do jogo previamente estabelecidas. Não se pode querer punir torturadores de uma ditadura militar passando-se justamente por cima do que nos diferencia deles: o Estado Democrático de Direito.

O desfecho desse impasse será proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, que terá que ponderar os conceitos de perdão: absolvição, indulto, e o de justiça: prática e exercício do que é direito, para poder alcançar uma decisão em conformidade com o Direito, com a Lei.

Colaboração de Bárbara Araujo