sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

O Perdão Individual e a Justiça Coletiva

Nossa sociedade vive sob diversas influências, exercidas direta e indiretamente em nossas ações. Duas das principais influências são a religião e o direito. Apesar de ambas terem diferentes graus imperativos em nosso comportamento, são extremamente importantes, e buscam finalidades diferentes.
A religião Católica ainda é a mais influente em nosso país. Através da nossa história ela perdeu poder, mas seus princípios ainda estão enraizados em nossa cultura. Um dos pontos mais importantes da doutrina católica é o perdão. Em diversas passagens da Bíblia vemos Jesus ensinando a perdoar ao próximo, não é preciso ser esforçar para lembramos o caso do apedrejamento da mulher adultera em que ele proferiu umas de suas frases mais lembradas: “atire a primeira pedra quem nunca errou”. Outro caso bíblico é o de Maria Madalena a prostituta arrependida que se tornou um de seus seguidores mais devotos e foi a primeira a ver seu túmulo vazio. E, por último, sua própria morte traduz sua mensagem: Ele não odiou as pessoas que o condenaram injustamente, em um ato que resume todos seus ensinamentos, ele as perdoou.
Apesar da importância da religião, é a Lei que possui a força coercitiva para se impor legitimamente, mesmo que contra a vontade e o interesse de uma ou um determinado grupo de pessoas.
A chamada justiça, que todos desejam quando ingressam no judiciário buscando solucionar um litígio, na maioria das vezes envolve perda para uma das partes em favor de um ganho para outra. Esse ganho pode ser “justo” ou não, o que importa na maioria das vezes é a garantia de que a sociedade continuará. A segurança jurídica é fundamental para o prosseguimento tranqüilo da sociedade.
Entretanto, para a maioria da sociedade a justiça não pode ser obtida por meio das decisões judiciais. Justiça envolve uma punição igual ao delito cometido, um grande exemplo disso é a mobilização que ocorreu no caso de Isabela Nardoni. Situação na qual centenas de pessoas ficaram por dias em frente ao prédio da menina, unindo-se em uma turba que clamava por justiça, porém o que eles queriam era sangue, um apedrejamento público, assim como aquele que Jesus interrompeu. Penalidade muito diferente da prevista para o homicídio. O mais assustador, porém, é o fato de que não havia nenhum prova concreta da autoria do fato, no entanto o casal já estava condenado pela opinião pública. Para a sociedade em geral, justiça requer uma ação mais cruel que a cometida pela pessoa, é o sangue por sangue.
O curioso é imaginar que em um país católico como o Brasil, em que a maioria das pessoas se diz praticante, a principal mensagem de Cristo não seja entendida. O perdão é diferente da justiça obtida nos tribunais. O perdão é um ato pessoal, enquanto uma sentença é uma decisão sobre uma lide, ela busca a pacificação social. Porém não é só em nosso país que a principal mensagem da religião não é compreendida, todas as religiões possuem a mesma idéia, porém o ser humano é selvagem, como diriam os contratualistas, ele precisa de um pacto social, de uma lei coercitiva para ser capaz de conviver harmoniosamente em sociedade.
A justiça que a lei busca pode ser pensada de diversas formas, um exemplo seria o direito penal, mesmo que os parentes da vítima ou ela mesma perdoem o transgressor, se a ação penal for pública incondicionada, pouca importa o perdão, pois o que se busca é a aplicação de uma punição que tem um caráter social mais importante, pois inibe outros de a repetirem, ao mesmo tempo em que, teoricamente, reeduca quem a cometeu. No entanto, mesmo o direito penal prevê a possibilidade do perdão judicial, concedido pelo juiz.
Pode se concluir, então, que Perdão e Justiça são coisas. O primeiro é um ato humano que requer esforço, pois não é fácil aceitar algo que nos desagrada e machuca, quanto mais ser capaz de não querer devolver o sofrimento causado, criando um círculo de mais dor. Em segundo lugar, a justiça que deve ser entendida como uma necessidade para a vida social, uma garantia para todos, que barra os instintos humanos e através de punições tem o poder de coibir.
Sendo assim, percebe-se que o Perdão é individual e gera efeitos apenas para quem perdoa e quem é perdoado, enquanto a Justiça é social e envolve todos, pois ao punir alguém ou garantir o pagamento de uma dívida ela está garantindo a existência da própria sociedade.

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